1 - Introdução ao Vodu
Vodu é uma tradição
espiritual originada no Haiti durante o período de escravidão colonial
francesa. Africanos de muitas linhagens étnicas foram transportados à força
para o Haiti, para servirem principalmente como escravos agricultores. Os povos
nativos das ilhas, os Taino e os Carib, foram exterminados pelos espanhóis
durante as primeiras invasões. Durante este período histórico, europeus da
França e de outros países, incluindo deportados pro-Stuart da Escócia,
radicaram no Haiti. Devido à tantas linhagens estarem representadas, nenhum
culto africano poderia satisfazer todos os participantes, pois a reverência aos
ancestrais era muito importante. Entretanto, cada nação tomaria sua vez num
encontro. Essa alternância de cultos eventualmente evoluiu para a ordem
cerimonial da liturgia Vodu. Durante este período formativo é que foram
adotadas também entidades européias pré-cristãs, como Brigid, ou Maman Brigitte
na tradição vodu. Também houve uma pequena influência das populações restantes
de Tainos e Caribs.
Também há sectos no Vodu,
assim como em tantas outras religiões. O primeiro e mais amplamente conhecido é
o Vodu Ortodoxo. Nesta seita, o Rito Dahomeano tem posição de primazia e as
iniciações são conduzidas com base principalmente no modelo dahomeano. Um sacerdote
ou sacerdotisa recebe o asson, um chocalho ritual, como símbolo do sacerdócio.
Neste rito, um sacerdote é chamado de Houngan, ou às vezes de Gangan; uma
sacerdotisa é conhecida como Mambo.
No vodu ortodoxo, as linhas
Iorubás também têm certa proeminência. Outras nações ou linhagens que não a
Dahomeana são vistas com menor importância, como subtítulos na ordem
cerimonial. Este rito é amplamente representado no Haiti, e concentrado em Port
Au Prince e no sul do Haiti.
O segundo secto é chamado de
Makaya. Neste rito, as iniciações são menos elaboradas e o sacerdote ou
sacerdotisa não recebem o asson. Um sacerdote makaya é chamado de Bokor e uma
sacerdotisa é às vezes chamada de Mambo, às vezes de sorcière. Os termos bokor
e sorcière são pejorativos no vodu ortodoxo e o termo bokor pode também servir
para classificar um especialista em magia maléfica não iniciado, também chamado
de malfacteur.
Tais indivíduos não são
clericais em qualquer seita. A liturgia makaya é menos uniforme de peristilo (
terreiro ) para peristilo do que a do vodu ortodoxo e há uma ênfase maior na
magia do que na religião. Este rito está presente em Port Au Prince e é
fortemente representado no Vale Artibonite, no Haiti central.
Um terceiro secto é o Rito
Kongo. Como o próprio nome já diz, é quase que exclusivamente representante da
tradição do Kongo. A iniciação é baseada no modelo kongo; o sacerdote e a
sacerdotisa são ambos chamados de Serviteur. No vodu ortodoxo, um(a) serviteur
é apenas o iniciado que serve o Loa (deidade do vodu). Este rito está
concentrado perto de Gonaives, no centro do Haiti e um grande festival anual
dos Kongo é realizado perto em Sucrie, perto de Gonaives.
Todas estas tradições têm
pontos em comum :
- Há apenas um Deus, chamado
de Gran Met, o Grande Mestre; e também de Bondye, do francês Bon Dieu, o Bom
Deus.
- Há entidades menores,
chamadas de Loa (singular). Elas são consideradas acessíveis de imediato
através do mecanismo de possessão. Tal estado é considerado normal e natural
dentro do contexto duma cerimônia vodu e também altamente desejável, havendo
entretanto uma certa etiquette para a mesma ocorrer, que será discutida em
lições mais avançadas.
- Todos os ritos empregam
orações, cânticos, percussão, roupas específicas e danças durante as
cerimônias.
2 - Quem pode participar do
Vodu ?
Qualquer um pode participar
dos ritos. Não há qualquer requisito de sexo, raça, idade, opção sexual ou
origem nacional. Muito menos é pedido para se abandonar crenças e afiliações
religiosas anteriores. No Haiti, a vasta maioria de praticantes é também
católica romana.
Há vários níveis de
participação, é claro, como em quase todas as outras religiões. Uma cerimônia
vodu é pública e qualquer um pode entrar no peristilo, ou templo, e observar.
Participação na cantoria e na dança são encorajadas. Porque não há qualquer
hierarquia centralizada, pagando salário para houngans e mambos, e porque o
templo é propriedade privada, é considerada normal uma pequena doação em
dinheiro. Este dinheiro é normalmente empregado para pagar os percussionistas,
as comidas que são oferecidas aos participantes, para a manutenção do peristilo
e dos sacerdotes envolvidos. Isto é freq&utrema;entemente difícil de
entender para pessoas criadas em tradições judaico-cristãs, onde padres,
pastores e rabinos são profissionais assalariados.
Indivíduos que tenham um
grau iniciático podem participar de cerimônias privadas relativas à outros
indivíduos de seu próprio grau ou mais baixo. Pessoas com graus mais baixos não
podem participar de cerimônias aferidas a graus mais altos porque o
conhecimento ali presente é secreto e elas não seriam competentes para lidar
com a mesma.
Houve algumas controvérsias
nos últimos anos nos EUA sobre afiliação e participação étnica em religiões
afroamericanas. Alguns houngans e mambos inescrupulosos enganam estrangeiros
desavisados, realizando cerimônias falsas e cobrando taxas exorbitantes. Outros
têm um certo entendimento silencioso de que eles não revelarão o conhecimento
secreto do Vodu, isto é, informação e iniciação corretas, a pessoas que não
sejam pretas e que não sejam haitianas. Entretanto, outros houngans e mambos
têm a visão que as pessoas são escolhidas pelos loa, e não de outra maneira, e
que qualquer sacerdote que recuse iniciar e treinar um estrangeiro enviado por
um loa irá sofrer graves conseqüências. A iniciação requer um período
significante de estudo e o compromisso mostrado por um estrangeiro será o
suficiente para qualquer sacerdote/sacerdotisa oficiante. Eu inclusive vi um
houngan defender vigorosamente seu candidato não haitiano e refutar quaisquer
opiniões que invalidassem o iniciante.
Eu ressalvo que o respeito
pelos negros de qualquer parte do mundo é imanente às tradições vodu. Nunca
devemos esquecer que incontáveis negros foram arrancados de suas terras, estuprados,
torturados, castrados e queimados vivos num esforço para erradicar o vodu. O
Vodu deu suporte ao ímpeto de resistência à escravidão colonialista e foi
combustível para a única rebelião de escravos de sucesso real na América, sendo
responsável pela formação da primeira república independente negra americana.
Mesmo recentemente na ocupação militar ianque no Haiti, de 1915 a 1934, foi
realizado um esforço sistemático para a erradicação do vodu.
Templos foram destruídos,
tambores ancestrais sem preço foram queimados e houngans e mambos foram
surrados, presos e assassinados.
3 - Nomes e Graus dos Níveis
Iniciatórios do Vodu
Há uma série de níveis
iniciatórios no vodu ortodoxo, que são atingidos seqüencialmente conforme o
indivíduo cresce em conhecimento e permanência na comunidade vodunista. Todos
os graus de iniciação estão abertos tanto para os homens como para as mulheres.
Uma pessoa não iniciada que
freqüenta as cerimônias, recebe aconselhamento e tratamento medicinal do
houngan ou da mambo e toma parte nas atividades do vodu é normalmente chamada
de vodunista. Este é um termo geral, assim como cristão ou budista .
Um não iniciado que está
associado a um peristilo em particular, freqüenta as cerimônias regularmente e
aparenta estar sendo preparado para a iniciação é classificado como hounsi
bossale. Hounsi é da linguagem Fon dos Dahome e significa noiva do espírito ,
embora o termo no Haiti seja utilizado para homens e mulheres. Bossale
significa selvagem ou indomado , no sentido de um cavalo selvagem.
O primeiro grau de iniciação
confere o título de hounsi kanzo. Kanzo, também do Fon, refere-se ao fogo, e a
cerimônia do fogo, também chamada de Kanzo, empresta seu nome a todo o ciclo
iniciático. Indivíduos que são kanzo podem ser comparados a batizados numa
seita cristã. Numa cerimônia vodu, os hounsi kanzo vestem-se com uma roupagem
branca, formam o coro e são prováveis candidatos de possessão pelos loa.
O segundo grau é chamado de
si puen, sur point em francês, isto é, no ponto , sobre o ponto . Este termo se
refere ao fato de que o iniciado passa por cerimônias no ponto ou apadrinhado
por um loa em particular. Essa pessoa é então considerada um houngan ou uma
mambo e lhes é permitido o uso do asson, sagrado chocalho emblema do
sacerdócio.
Indivíduos que são si puen
podem ser comparados a pastores de seitas cristãs. Numa cerimônia eles conduzem
orações, cânticos e rituais e são candidatos quase inevitáveis para possessão.
Uma vez iniciados como sur point eles podem realizar iniciações de hounsi kanzo
e de si puen.
O terceiro e último grau de
iniciação é o asogwe. Houngans e mambos asogwe podem ser comparados aos bispos
das seitas cristãs, pois podem consagrar outros sacerdotes. Indivíduos que são
asogwe podem iniciar outros em kanzo, si puen e em asogwe. Numa cerimônia eles
são a autoridade final sobre os procedimentos, a menos que um loa esteja
presente e manifesto através do mecanismo de possessão. Eles são também o
último recurso quando a presença de um loa específico é requerida. É dito que
um asogwe tem o asson , referindo-se à capacidade do asogwe de conferir um
outro iniciado com o asson, elevando então o grau deste a asogwe.
Mesmo um houngan ou mambo
asogwe deve submeter-se à opinião do houngan ou da mambo que o iniciou, dos que
foram iniciados em asogwe antes dele, do houngan ou mambo que iniciou seu
iniciador, dos iniciadores deste e por aí vai. Estas relações podem se tornar
realmente complexas e há um ponto na cerimônia do vodu ortodoxo onde todos
houngans e mambos, sur point e asogwe, participam duma série de gestos e
abraços rituais que servem para elucidar e regular estas relações.
LIÇÃO 2
OS ANCESTRAIS
Parte 1 - Os Ancestrais e a
Maneira Vodu de Recuperação dos Mortos
Os ancestrais, zanset yo no
Creole haitiano, estão sempre com um vodunista. Ele vive, age, respira com a
consciência de sua presença. O hino nacional do Haiti começa assim Pelo país e
pelos ancestrais, nós andamos unidos...
No interior do Haiti, cada
aglutinado familiar tem seu cemitério familiar. As tumbas dos familiares são tão
elaboradas quanto possível. Algumas lembram casas nas quais a cripta é
subterrânea. As estruturas construídas para as famílias ricas podem até conter
pequenas salas de estar, com um retrato do falecido e boas cadeiras. Quando um
visitante adentra as terras de uma família para uma visita extensa, a cortesia
requer que ele faça uma pequena libação de água nas tumbas para que os
ancestrais o recebam bem. Membros da família e convidados podem também, a
qualquer momento, fazer uma iluminação . Velas ou fitas de cera de abelha são
acesas, colocadas nas tumbas e então uma pequena prece é dita.
Na cidade, a lei requer que
se enterre no cemitério da cidade. Novamente, as estruturas podem ser bem
elaboradas e grandes cadeados e outros meios de segurança são usados para
evitar que violadores de tumbas roubem metais, ossos e outros artigos da pessoa
morta.
Os ossos de indivíduos
mortos são considerados de grande poder mágiko, especialmente se a pessoa morta
fosse um houngan ou uma mambo ou fosse de alguma maneira notável e distinta,
para o bem ou para o mal.
Um vodunista é enterrado com
uma cerimônia católica romana e uma vigília é feita durante nove dias após a
morte. A nona noite é chamada de denye priye, a última prece. Após a última
prece, a parte católica do funeral é encerrada.
Em algum ponto, antes ou
após a cerimônia católica, a cerimônia de vodu desounin é realizada. Neste
rito, as partes componentes da alma e da força de vida da pessoa e o loa
primário na cabeça da pessoa são separados e enviados para seus destinos
corretos. O desounin de um houngan famoso e altamente respeitado pode ser
assistido por centenas de enlutados lamentosos vestidos de robes brancos. É
neste momento que o herdeiro de qualquer loa familiar libertado do falecido é
normalmente revelado, ficando o indivíduo escolhido brevemente possuído.
Um ano e um dia após a morte
do indivíduo pode ser feita a cerimônia mo nan dlo (tirar o morto da água). O
espírito da pessoa é chamado através de um vaso com água, que é coada por um
lençol branco para um pote de barro limpo chamado govi, onde é
ritualisticamente instalado. A voz do morto pode ser ouvida através do govi ou
através de uma pessoa brevemente possuída para o propósito. O govi é
reverentemente colocado no djevo, ou salão interno do templo.
Algumas vezes o espírito de
um ancestral pode retornar por sua própria vontade como um loa Ghede.
Parte 2 - Os loas ancestrais
: Baron, Maman Brigitte e os loa Ghede
BARON - O cabeça da
família de ancestrais loa é o Baron (barão). Ele é mestre do cemitério e guardião
do conhecimento ancestral. Ele tem vários aspectos incluindo Baron Samedi,
Baron Cemetiere, Baron la Croix e Baron Criminel. Em todos seus aspectos ele é
um loa masculino com uma voz nasal, carrega um cajado ou baton, usa impropérios
livremente e se veste de negro ou púrpura. Ele é considerado o último recurso
para mortes causadas por magia, porque mesmo se um feitiço trouxer uma pessoa
para perto da morte, se o Baron se recusar a cavar a cova , a pessoa não morre.
Baron, com sua esposa Maman
Brigitte, é também responsável por recuperar as almas dos mortos e
transformá-las em loa Ghede. Baron pode ser invocado para casos de esterilidade
e ele é o juiz divino para o qual as pessoas podem trazer seus pedidos,
cantando :
Ó kwa, Ó jibile ! 2x (Ó
cruz, Ó júbilo !)
Ou pa we m inosan ? (Não vês que sou inocente ?)
Ou pa we m inosan ? (Não vês que sou inocente ?)
O túmulo do primeiro homem
enterrado em qualquer cemitério do Haiti, quer a pessoa em vida participasse do
Vodu ou não, é dedicado para o Baron (não Ghede) e uma cruz cerimonial é
erigida no ponto. Em terrenos familiares no interior, uma família pode erigir
uma cruz para o Baron de sua linhagem e nenhum peristilo é completo sem sua
cruz para Baron. Baron pode ser invocado a qualquer momento e ele pode aparecer
sem ser chamado, tão poderoso é ele. Ele bebe rum no qual vinte e uma pimentas
vermelhas foram pisadas, bebida que mortal algum pode suportar. Suas comidas
cerimoniais são café preto, amendoim grelhado e pão. Ele dança
extraordinariamente banda improvisada e às vezes coloca seu bastão no meio das
pernas, representando assim o falo. Baron é um loa muito masculino.
O Festim dos Ancestrais, Fet
Ghede, é considerado o final do velho ano e o começo do novo, tal qual na
tradição européia Wicca. Quaisquer débitos com Baron, Maman Brigitte ou Ghede
devem ser pagos nesta festa. O Baron Criminel canta para seus devedores :
Bawon Criminel, map travay
pou ve de te yo, m pa bezwenn lajan ! 2x
Bawon Criminel, Ó! Lane a bout o, map paret tan yo !
Bawon Criminel, Ó! Lane a bout o, map paret tan yo !
Barão Criminal, estou
trabalhando para os vermes da terra (pessoas pobres), eu não preciso de
dinheiro ! 2xBarão Criminal, Ó ! O ano terminou, eu aparecerei para esperá-los (para
pagarem-me) !
MAMAN BRIGITTE
Maman Brigitte,
surpreendentemente para um loa de Vodu, é britânica em origem, descende de
Brigid/St. Brigit, a deusa tripla celta de poesia, forjaria e cura. Ela deve
ter entrado para o Haiti nos corações dos escravos deportados escoceses e
irlandeses. Há uma canção que nós cantamos em cerimônias : Maman Brijit, nan
anglete de soti de li, Maman Brigitte, ela é da Inglaterra..." (Eu penso
que Brigid era escocesa, não inglesa, mas talvez no Haiti a palavra anglete
represente todas as Ilhas britânicas.)
Hoje em dia, Maman Brigitte
é considerada esposa do Baron, mestre do cemitério e chefe de todos os
ancestrais, conhecidos como loa Ghede. O túmulo da primeira mulher enterrada em
qualquer cemitério no Haiti é consagrado a Maman Brigitte e lá é erigida a cruz
cerimonial dela. Ela, também como o Baron, é invocada para elevar o morto
", significando curar e salvar os que estão no ponto de morte por
enfermidade causada por magia. Aqui está uma canção muito famosa sobre Maman
Brigitte cantada em cerimônias de Vodu:
Mesye la kwa avanse pou l we yo!
Maman Brigitte malad, li kouche sou do,
Pawol anpil pa leve le mo (morts de les, Fr.)
Mare tet ou, mare vant ou, mare ren ou,
Yo prale we ki jan yap met a jenou.
Maman Brigitte malad, li kouche sou do,
Pawol anpil pa leve le mo (morts de les, Fr.)
Mare tet ou, mare vant ou, mare ren ou,
Yo prale we ki jan yap met a jenou.
Cavalheiros da cruz (os
antepassados falecidos) avancem para ela vê-los!
Maman Brigitte está doente,
ela se deita de costas, muita conversa não elevará a morta,
Amarre sua cabeça, amarre sua barriga, amarre seus rins,eles verão como eles ajoelharão.
Amarre sua cabeça, amarre sua barriga, amarre seus rins,eles verão como eles ajoelharão.
(Significando, arregace as
mangas para se preparar , nós faremos para as pessoas que fizeram este feitiço
maléfico ajoelharem-se, implorar perdão e receber o castigo delas.)
Maman Brigitte, como o resto
da constelação Ghede é um loa boca-dura que usa muitas obscenidades. Ela bebe
rum com pimenta, tão quente que uma pessoa não possuída por um loa nunca
poderia beber isto. Ela também é conhecida por passar pimentas haitianas quentes
na pele dos órgão genitais do cavalo e este é o teste para o qual são
sujeitadas as mulheres suspeitas de falsa possessão . Ela dança a banda
sexualmente sugestiva e artística e seu virtuosismo na dança é legendário.
Maman Brigitte e Baron são a mãe e o pai que recuperam os mortos e os
transformam em loa Ghede e os removem das águas místicas onde eles estavam sem
conhecimento da própria identidade, nomeando-os. Há uma canção melancólica
sobre a condição das almas nas águas místicas que também é cantada quando um
iniciado está preparando-se para o período de exclusão, morte ritual e
renascimento do ciclo de iniciação:
O LOA GHEDE
Os loa Ghede são uma família
enorme de loa, tão numerosos e variados como eram as almas das famílias das
quais eles se originaram. Desde que eles são todos membros da mesma família, as
crianças espirituais de Baron e Maman Brigitte, eles têm todos o mesmo
sobrenome - La Croix, a cruz. Não importa outros nomes que eles possam vir a
carregar, a assinatura deles sempre é La Croix.
Algum os nomes de Ghede
incluem: Ghede Arapice Croix, Brav Ghede de la Croix, Ghede Secretaire de la
Croix, Ghede Ti-Charles la Croix, Makaya Moscosso de la Croix; e nomes tristes
e degradantes como GhedeTi-Mopyon la de Deye Croix (Ghede Pequeno Piolho de
Caranguejo Atrás da Cruz), Ghede Fatra de la Croix (Lixo Ghede da Cruz), Ghede
Gwo nan de Zozo CrekTone de la Croix (Ghede Pinto na Buceta Trovão da Cruz) e
por aí vai.. Há uma razão para estes nomes estranhos que ficará clara mais à
frente.
A vasta maioria de Ghedes é
masculina. Ghede pode possuir qualquer um, a qualquer hora, até mesmo os
protestantes (para enorme vergonha deles.) No Haiti eu tenho uma amiga que um
dia estava observando um grupo de mulheres possuído por Ghede dançando a banda.
Ela disse algo como, " Olhe as prostitutas nojentas, elas não têm nenhum
respeito por si mesmas . Naquele mesmo lugar, a Ghede possuiu minha amiga, a
lançaram ao solo, prostraram-na e declararam que ela iria se juntar aos
ancestrais! Súplicas e intercessões dos familiares finalmente pacificaram o
Ghede que prometeu ceder - com a condição de que a mulher e tornasse Mambo!
Mambo Delireuse agora pratica em uma área rural próximo del'Artibonite de
Riviere Delicada, no Haiti central! Os Ghedes são figuras muito transitivas,
existindo entre a vida e a morte, entre os antepassados em Guiné e entre os
homens e mulheres vivos do Haiti. Talvez é por isto que eles sejam homenageados
a meio caminho da plena cerimônia de Vodu ortodoxa, depois do Rada (Dahomean e
Iorubá) e antes do Petro.
O Ghedes vestem-se quase
como seu pai Baron - roupas negras ou púrpuras, chapéus elaborados, óculos
escuros, às vezes sem uma lente, um cajado ou baton. Eles também dançam a
banda, mas eles retêm mais da personalidade da pessoa de quem eles se originaram.
A família de Ghede,
incluindo o pai e a mãe, o Baron e a Maman Brigitte, são absolutamente notórios
no uso de baixarias e termos sexuais. Há uma razão para isto - os Ghede estão
mortos, além de qualquer castigo. Nada mais pode ser feito a eles, assim o uso
de profanidades normalmente entre os haitianos um pouco formais são um modo de
declaração, "Eu não me preocupo! Eu passei além de todo o sofrimento, eu
não posso ser ferido ". Num país onde desrespeito para com figuras de
autoridade era até recentemente punido com tortura ou morte, esta é uma
mensagem poderosa. Porém, esta profanidade nunca é usada de modo maligna ou
abusiva, para amaldiçoar alguém. Sempre é humorístico, até mesmo quando há uma
forte mensagem envolvida.
Há algumas canções muito imponentes
e dignas cantadas para Ghede, particularmente o mais velho, raciais ou aspectos
raiz, como Brav Ghede. Hoje em dia, entretanto, a ênfase está no humor sexual e
obsceno promovido pelos loa Ghede. Aqui está uma canção popular cantada para
Ghede em peristilos de Vodu e em celebrações públicas:
Si koko te gen dan li tap
manje mayi griye,
Se paske li pa gen dan ki fe l manje zozo kale!
Se vagina tivesse dentes,
comeria milho assado,
É porque não tem nenhum dente que come pênis descascado !
Da mesma maneira, é dito que
um ghede é um ladrão. É verdade que ele se apropria do que quiser de vendedores
de rua, mas uma vez que este ceda às demandas do loa, este se limita a pegar um
pouco de coco ou de milho de assado. Na Fet Ghede, a maioria dos terreiros cozinham
especialmente comida para as centenas de Ghedes que aparece vagando pelas ruas.
Aqui está uma canção que uma multidão de Ghedes cantou enquanto iam para a casa
de uma Mambo famosa e particularmente generosa da área de Port au Prince :
Ting ting ting ting kay Lamesi,
Whoi mama,
Kay la Mesi gen yon kochon griye,
Whoi mama!
Whoi mama,
Kay la Mesi gen yon kochon griye,
Whoi mama!
Ting
ting ting ting a casa de Lamesi
Mamãe de Whoi,
A casa de Lamesi tem uma porca inteira assada,
Mamãe de Whoi!
Mamãe de Whoi,
A casa de Lamesi tem uma porca inteira assada,
Mamãe de Whoi!
FET GHEDE NO HAITI
ATUALMENTE
Dois de novembro, Dia dos
Mortos, normalmente chamado de Fet Ghede (pronuncia-se guêdei)é um feriado
nacional no Haiti. Católicos assistem missa de manhã e então vão para o
cemitério, onde eles rezam e fazem consertos nas tumbas de familiares. A
maioria dos católicos haitianos também são vodunistas, e vice-versa, de modo
que no caminho para o cemitério muitas pessoas mudam de roupas, do branco que
eles vestem para ir à igreja para o púrpura e negro dos loa Ghede, os espíritos
de antepassados.
No meio da manhã as ruas de
Port Au Prince estão atulhadas de milhares de pessoas. Dúzias já estão
possessas por um Ghede e suas vozes nasais, piadas obscenas e giros da dança
banda os fazem inconfundíveis. Grand Cemetiere, o cemitério principal de Port
Au Prince, é lotado por pessoas. Multidões apertam-se ao redor da cruz
cerimonial de 8 metros de Baron e da cruz menor de Maman Brigitte. Muitos
trazem oferendas de café e rum que eles vertem ao pé das cruzes. Eles também
oferecem pão, amendoim grelhado, milho assado e às vezes comida apimentada.
Ocasionalmente uma pessoa,
normalmente um Houngan ou Mambo, sacrificam uma galinha ou um par de pombos. As
oferendas são rapidamente consumidas pelos mendigos que se amontoam pelo
cemitério. Algumas pessoas vendem velas, fitas de cera de abelha e imagens
religiosas de santos para representar o Baron, Maman Brigitte e os Ghedes.
Imagine uma Mambo em saias
volumosas de negro e lavanda, um babado das mesmas cores, vários lenços de seda
amarrados ao redor de sua cabeça e fios de contas ao pescoço dela; ela
aproxima-se da cruz de Maman Brigitte com seus hounsis (os que receberam a
primeira iniciação.) Ela leva fitas de cera de abelha pegajosa que ela afixa a
cada braço da cruz e ao centro. Então ela retira uma galinha preta de seu saco
de palha e a passa em cima dos corpos dos hounsis, removendo todas as más
influências. Depois da oração, ela mata a galinha rapidamente da mesma maneira
que ela faria para uma refeição ordinária. O sangue jorra na cruz e ela doa a
galinha a uma mendiga faminta que espera. A Mambo é possuída por Maman Brigitte
e profetiza os eventos do próximo ano. Um do hounsis que se comportou mal é
castigado com alguns tapas gentis e um que está doente recebe uma receita para
um tônico de ervas. Então Maman Brigitte encharca a cruz dela com rum, canta e
dança a banda com grande virtuosismo para alegria dos presentes. Alguns
momentos depois ela sai da cabeça da Mambo, que ,novamente consciente,
recompõe-se a e deixa o cemitério com dignidade extrema.
Pela cidade, no cemitério de
Drouillard, onde é enterrado o mais pobre dos pobres, as pessoas do bairro Cite
de Soleil, a adoração é ainda mais intensa. Filas de vodunistas de vários
peristilos marcham cantando atrás de times de percussionistas, com cada vez
mais pessoas sofrendo possessões conforme eles se aproximam do cemitério. Os
que permanecem conscientes visitam os sepulcros de amigos e parentes e falam a
eles como se pudessem ouvir debaixo do solo.
" Olhe, Papai, "
diz uma mulher, " eu trouxe comida para você ".
Irmão mais velho, lamenta um
homem jovem, " o Exército o matou, nós achamos seu corpo em pedaços, mas
todos eles estão aí, irmão, não estão? Você não tocará os tambores novamente
para nós, querido irmão.... Mamãe sente saudades, ela quis vir mas ela está
doente. Veja o rum que eu trouxe para você "!
Os loa Ghede varrem o
cemitério gritando piadas obscenas e cantando canções obscenas com todo o ar de
seus pulmões. Aqui está uma canção popular entre os Ghedes ano passado no
cemitério de Drouillard:
Zozo, tone! A la yon bagay
ingra, (repita)
Koko malad kouche, zozo pa bouyi te ba l bwe ,
Koko malad kouche, zozo pa vine we l.
Pênis, pelo trovão! Que
coisa ingrata, (repita)
Vagina está doente e cansada, pênis não ferve chá para ela,
Vagina doente e cansada, pênis não vem a ver.
Ano passado eu, uma Mambo
americana, deixei um peristilo com um Houngan e nossa congregação. O Houngan
teve em sua cabeça um Baron poderoso chamado Secretaire de la Croix, mas
Secretaire estava recusando-se a possuir o Houngan, porque o Houngan tinha pego
algum dinheiro dado para o Fet Gede e tinha usado para seus próprios
propósitos. O Houngan foi muito humilhado, e decidiu ir diretamente para o
cemitério pedir perdão.
Eu fiz uso de um caminhão,
assim nós o enchemos de membros de nosso peristilo e rumamos pelas ruas
sufocadas para o cemitério. Nós ficamos presos no tráfego e como esperamos
demais, Baron Secretaire de la Croix ficou impaciente e me possuiu!
Até onde me foi falado,
havia um carro na pista da contramão, também parado. Secretaire abriu a janela
do motorista da pickup e começou a falar com os ocupantes do carro, muito
surpreendidos por ver um Baron na cabeça de uma Mambo estrangeira! Duas
senhoras muito ricas sentadas na parte de trás do carro foram para quem Baron
prestou honra especial.
" Boa noite, senhoras.
Baron disse.
" Boa noite, Baron,
Papai." elas deram risada.
" E como estão seus
clitóris hoje ? o Baron inquirindo muito seriamente.
Se seus clitóris não
estiverem bem, vocês podem me falar e eu direi para esses dois grandes pênis
velhos na frente do carro para entrarem em ação!
As mulheres que em qualquer
outra circunstância teriam ficado furiosas, riram, como fizeram os dois homens
na frente do carro. As velhas apoiaram na janela e responderam ao Baron.
" Nossos clitóris estão
muito bem, Papai Baron. Muito obrigado !
E em alguns momentos cessara
o trânsito intenso e o Baron me lançou da possessão e me deixou dirigir a
pickup até o cemitério e lidar com a vergonha de nossos membros do peristilo
rirem histericamente, relatando o incidente para mim!
À noite, cada peristilo faz
uma dança em honra de Baron, Maman Brigitte, e dos Ghedes. As pessoas que vêm
devem estar todas alimentadas e os loa que aparecem também são festejados com
caldeiras de comida especialmente preparadas para eles. A dança segue ao longo
na noite, mesmo até a alvorada. O talento artístico dos loa é incomparável e
até mesmo não-vodunistas vêm assistir. Então os adoradores exaustos voltam para
casa, esperar o próximo Fet Ghede do ano seguinte.
O LWA
Parte 1 - Características
Gerais dos Loa
O Vodu é mal entendido
freqüentemente como sendo politeísta, sincrético e animista. Estes conceitos
errados serão clareados conforme nós discutirmos as características dos loa.
Vodunistas acreditam em um
Deus, Gran Met, ou Grande Mestre. Este Deus é todo poderoso, onisciente, mas
lamentavelmente ele é considerado algumas vezes distante e destacado de
negócios humanos. Ele é não obstante presente na fala diária dos haitianos que
nunca dizem "Até amanhã", sem que somem " se Deus quiser ".
Os loa são entidades
menores, mas mais prontamente acessíveis. À parte de um amor generalizado para
com os descendentes de africanos, os loa requerem uma relação mútua com o
adorador. Os loa servem aqueles que os servem. Os Loa têm características bem definidas,
incluindo números sagrados, cores, dias, comidas cerimoniais, maneirismos de
fala e objetos rituais. Então, um loa pode ser servido usando-se roupas das
cores do loa, fazendo oferendas de comidas preferidas e observando os dias
sagrados para o loa.
Muitos loa são figuras
arquetípicas representadas em muitas culturas. Por exemplo, Erzulie Freda é uma
deusa de amor comparável a Vênus, Legba é um loa da comunicação comparável a
Hermes ou Mercúrio. Estas correspondências, e às vezes pura coincidência, levou
os haitianos a comparar aspectos de loa e imagens de santos católicos como eles
eram representados em litografias populares. Durante os dias do colonialismo
francês, quando a maioria de pessoas pretas no Haiti eram escravas que haviam
nascido na África, a adoração dos santos proveu uma cobertura conveniente para
os rituais de deuses africanos. Até mesmo o priere Guiné, uma oração longa
recitada perto do começo de cerimônias de Vodu ortodoxas, incorporam versos
sobre a Virgem Maria e vários santos.
Isto não significa, porém,
que os loa foram sincretizados com os santos católicos. Ninguém confunde Ogoun
Feraille com São James, o Grande, simplesmente a imagem que é usada. Se São
James é invocado, ele é considerado diferente de Ogoun. Embora o priere Guiné
incorpore versos sobre santos católicos, ninguém confunde uma cerimônia de Vodu
realizada num peristilo com uma missa católica. John Murphy, em seu livro
Santeria , propõe simbiose como um termo mais preciso que sincretismo.
Os Loa às vezes são considerados
residentes em árvores, pedras ou raramente em animais. Porém, o loa na árvore
não é o loa da árvore e cerimônias realizadas ao pé da árvore são dirigidas ao
loa, não a qualquer princípio animista de energia vital pertencente à árvore.
Os Loa do Vodu manifestam sua vontade através de sonhos, incidentes incomuns e
através do mecanismo de possessão. A possessão é considerada normal, natural e
desejável no contexto de uma cerimônia de Vodu e sob outras circunstâncias. Lwa
que se manifestam por possessão cantam, dançam, contam piadas, curam doentes e
dão conselhos.
Parte 2 - Que grupos de loa
são reconhecidos ?
Em uma cerimônia de Vodu
ortodoxo, seguinte ao priere Guiné e às saudações para a assembléia e à energia
espiritual dos tambores e percussionistas, os loa são honrados em seqüência. A
sua vez, são oferecidas canções para cada loa e em casos específicos, oferendas
de comida ou sacrifícios de animais. Um iniciado tem que memorizar esta
seqüência como uma parte do seu treinamento e um Houngan ou Mambo devem poder
observar esta ordem quando administrando uma cerimônia. Um mínimo de três
canções são cantadas para cada loa e cada canção é repetida pelo menos três
vezes.
No rito de Vodu ortodoxo, há
três grupos principais de loa : o Rada, o Ghede e o Petro.
Os loa do Rada são
principalmente mas não exclusivamente Dahomeanos em origem. Suar cor cerimonial
é branca, com a qualificação que loas individuais dentro deste grupo podem ter
suas próprias cores. Eles são considerados misericordiosos e em alguns casos tão
antigos por serem vagarosos e desprendidos no agir. Os ritmos dos loas de Rada
são batidos em tanbou kon, tambores com tiras de madeira que seguram o couro
estirado em cima da cabeça de tambor. A pele do tambor maior, o maman, é couro
de vaca, o outro de couro de cabra. Os tambores são tocados com baquetas. Esta
parte da cerimônia é disciplinada, concentrada, meticulosa e cerebral.
Os loa Rada, em ordem
cerimonial, são como segue: Legba, Marassa, Maluco, Aizan, Damballah e Aida
Wedo, Sobo, Badessy,Agassou, Silibo, Agwe e La Sirene, Erzulie, Bossu, Agarou,
Azaka, o grupo Ogoun (St. Jacques de Ogoun, Ossange, Ogoun Badagri, Ogoun
Feraille, Ogoun Fer, Ogoun Shango, Ogoun Balindjo, Ogoun Balizage,
OgounYemsen).
Seguindo os loa Rada, vêm a
família Ghede incluindo Baron e Maman Brigitte. Não há nenhuma ordem
particularde aparição destes loa dentro do seu próprio grupo. Suas cores
cerimoniais são o violeta e o negro. O grupo dos Ghede é obsceno e lascivo, e
eles provêem boas risadas para segurar o intenso e disciplinado esforço da
seção Rada. Os Barons e Brigittes são muito místicos. Os Ghede estão sempre
ansiosos para contar piadas e dar conselhos.
Depois do Rada e do Ghede
resta uma parte da cerimônia dedicada para os loa do grupo Petro. Estes loa são
predominantemente do Congo e de origem ocidental. Sua cor cerimonial é
vermelha. Eles são considerados ferozes, protetores, mágikos e agressivo para
com os adversários. O ritmo dos loa Petro é batido em tanbou fey, tambores com
aro de corda que segura o couro estirado em cima da cabeça do tambor. A cabeça
deste tambor é exclusivamente de couro de cabra e é batido com as palmas das
mãos. Esta parte da cerimônia é quente, de ritmo rápido e excitante. Os loa
Petro, em ordem cerimonial, são como segue: Legba Petro, Marassa Petro,
Wawangol, Ibo, Senegal, Kongo, Kaplaou, Kanga,Takya, Zoklimo, Simbi Dlo, Gran
Simba, Carrefour, Cimitiere, Gran Bwa, Kongo Savanne, Erzulie Dantor (também
conhecida como Erzulie Je Rouge), Marinette, Don Petro, Ti-Jean Petro, Gros
Point, Simbi Andezo, Simbi Makaya.
Quando as três repetições da
canção final para Simbi Makaya são terminadas, a cerimônia acaba. Às vezes
participantes que são especificamente entusiasmados continuarão a cantar
canções populares que, embora relacionadas aos loa, necessariamente não são
parte da ordem cerimonial. Tais canções são parte da música popular haitiana,
feita por artistas haitianos. Uma vez que os participantes estejam satisfeitos,
os tambores são deitados e todos vão descansar em esteiras de talos de
bananeira até o alvorecer.
Parte 3 - Os loa chamados
Djab
A palavra djab no Crèole
haitiano é derivada do francês diable (diabo), mas o termo no contexto do Vodu
haitiano leva conotação diferente. Certos loa são individuais e sem igual,
servidos por só um indivíduo, às vezes uma Mambo ou um Houngan e são
considerados quase propriedade do indivíduo. Estes loa não se ajustam
facilmente na liturgia de Vodu ortodoxo, em qualquer dos três grupos. Tais loa,
e mesmo loa mais comuns, como os loa Makaya, são comumente chamados djab, mas
aqui na significação arcaica de espírito, não necessariamente bom ou ruim. A
função destes djab é mágika ao invés de religiosa. Um djab é freqüentemente
conjurado por um Houngan, Mambo ou Bokor, em nome de um cliente, para entrar em
ação agressiva contra o inimigo do cliente ou concorrente do mesmo. Um djab
requer pagamento do cliente por seus serviços, normalmente na forma de
sacrifício animal regularmente realizado.
Um Houngan ou Mambo que
servem um djab são normalmente protegidos de possíveis atos de agressão
fortuita pelo djab; geralmente por um garde, uma proteção mágika efetuada
esfregando ervas secas especialmente preparadas em cortes pequenos feitos
cerimonialmente na pele do indivíduo. O garde é anualmente renovado no
solstício de inverno, quando os membros se reúnem para preparar ervas.
As leves cicatrizes do garde
formam um padrão peculiar para a sociedade, e podem servir como uma marca
identificando membros. Por exemplo, eu tenho em meu ombro esquerdo um garde
conferido a mim pelo Houngan Sauvert Joseph que ajudou a minha iniciação. No
encontro anual de sua sociedade, eu recebi o garde do djab Kita Maza, um djab
protetor afável mas agressivo e a forma da cicatriz, uma cruz dupla semelhante
em forma a um jogo-da-velha, é distinguível para Kita Maza e para a sociedade
do Houngan Sauvert Joseph.
Djabs também pode ser
específicos para um determinado lugar. Nas cavernas de Bodde perto de Trouin no
sul do Haiti, acredita-se que resida um djab de nome Met Set Joune, Mestre Dos
Sete Dias. Até mesmo se uma Mambo, Houngan ou Bokor sirva este djab em um
peristilo localizado em outro lugar, as cavernas permaneceram a casa do djab.
Certos djabs particularmente
amorais podem ser invocados, drenar a energia vital de uma pessoa e efetuar seu
falecimento. Quando um djab é responsável pela morte de uma pessoa, o dito
crèole não é o djab matou a pessoa , mas ao invés, djab la manje moun nan, o
djab comeu a pessoa . Isto não significa que a carne da pessoa é comida canibalisticamente
pelo Houngan, Mambo ou Bokor possuído pelo djab, somente que o djab consome a
força vital da pessoa.
Um Houngan ou uma Mambo
ortodoxos estão sob juramento de nunca ferir alguém, embora as invocações de
djabs são mais freqüentes no caso de Bokors. Porém um iniciado de Vodu ortodoxo
pode invocar um djab e até mesmo dirigi-lo para matar uma pessoa, se a pessoa é
uma assassina, um ladrão profissional ou um seqüestrador profissional.
Mambo Marinette invocou uma
loa Petro freqüentemente chamada de djab, Erzulie Dantor, e executou o
sacrifício de um porco selvagem, à cerimônia de Bwa Caiman em 1794, o que
começou a revolução haitiana. Durante a revolução, djabs haitianos eram muito
importantes e acreditava-se que conferiam imunidade contra as balas desferidas
pelo escravizador francês branco. Até mesmo a morte da maioria dos membros da
força expedicionária do Gel. LeClerc devido a febre amarela foi devida ao
resultado do trabalho de djabs.
SEU ALTAR E PRIMEIRA
OFERENDA AOS ANCESTRAIS
Parte 1 - Construindo um
Altar
Pessoas de muitas fés
diferentes constróem altares. Até mesmo pessoas que não pertencem a qualquer fé
particular podem reservar um canto de um quarto onde eles se sentam e pensam,
meditam e rezam, fazem yôga ou tocam um tambor africano. Muitas vezes eles
criam altares improvisados que incluem muitos destes objetos - flores, pedras e
cristais, símbolos sagrados, fotografias ou imagens dos antepassados do
indivíduo ou de personagens importantes, incensos, instrumentos musicais,
velas, livros espiritualistas.
Conscientemente ou
inconscientemente, quando nós construímos altares nos comprometemos num esforço
em abrir a mais enigmática de todas as portas - a porta entre o mundo humano e
o mundo espiritual. Um altar é uma representação da mesma porta em termos
materiais - o altar é a porta. Quando você se senta na frente de seu altar,
você está convidando as forças espirituais do outro lado desta porta para te
notarem, te visitarem e agirem sobre você.
Considerando que a maioria
das pessoas que moram no Brasil não podem começar a prática desta religião
assistindo cerimônias de Vodu, uma das primeiras coisas que se pode fazer é
construir um altar. Os altares de Vodu são tão variados quanto os indivíduos
que praticam o mesmo. De certo modo, um peristilo é um altar, grande o bastante
para os adoradores dançarem ao redor do centro, tocar tambor, executar
sacrifícios, sofrer possessão - em resumo, representar cada aspecto do drama
cósmico. Dentro do peristilo há áreas dedicadas a um loa específico - a cruz do
Baron ou uma barraca de folhas de palmeira para Erzulie. Junto ao peristilo
existem salas menores chamadas djevo ou bagi nas quais são mantidos os objetos
cerimoniais de uma sociedade de Vodu. Porém, estes objetos que incluem
chocalhos sagrados, garrafas vazias para oferendas de bebida, tetes dados
durante a iniciação e potes de barro chamados govi, não têm uso algum para quem
não seja iniciado. Um modelo melhor é achado no kay myste (do francês caille
des mysteres, casa de mistérios). Estas são casas pequenas, freqüentemente não
maiores do que 5 a 7 metros, nas quais são construídos altares individuais para
cada loa que o dono da kay myste serve . Estes altares incorporam muitos
materiais comuns, facilmente disponíveis em todos lugares no mundo. Eles são notáveis
por sua individualidade e beleza. Frequentemente são construídos altares no
Haiti num chão sujo.
Sua kay myste pode consistir
em uma área pequena em seu quarto ou sala, embora o sentimento no Haiti é que
não é bom dormir no mesmo lugar com objetos consagrados ao loa, especialmente
com uma pessoa do sexo oposto; exceto durante a iniciação, quando o sexo é
proibido de qualquer maneira. Você pode separar esta área com uma cortina ou
separar um quarto inteiro para o serviço ao loa. As instruções que seguem lhe
darão sugestões para construir um tipo de altar muito básico que pode ser então
ser elaborado para o serviço a qualquer loa específico que você deseje.
Sugestões para construir um
altar básico:
No Haiti, quando um
Vodunista deseja fazer um altar em casa para um aspecto determinado de Deus, um
santo, ou um loa, eles freqüentemente compram certos objetos religiosos
identificados com qualquer princípio que eles queiram servir e então um Houngan
ou Mambo monta e consagra o altar. Alguns são feitos por definição em um chão
sujo, outros são construídos em plataformas de tábuas ou mais freqüentemente
de concreto.
Aqui está um possível método
para montar um altar básico em lugar fechado, sem ser em chão sujo. Adquira um
pano branco e lave em água com sua primeira urinada da manhã. Você pode
substituir a urina por vinagre. Deixe o lençol secar ao ar livre, ao sol se
possível. Cubra sua mesa de altar com ele e então borrife-o levemente com seu
perfume favorito. Logo, consiga quatro pedras pequenas que encontre próximas à
sua casa, limpe-as deixando-as de molho com sal grosso e enxaguando bem, então
coloque uma pedra em cada canto de seu altar. Limpe uma garrafa de vinho, uma
tigela de vidro ou outra vasilha e encha de água. Não use metal ou louça -
apenas vidro ou cristal. Coloque-a no centro de seu altar e adicione três de
porções de anisete ou rum branco assim que você abençoar a água.
É comum no Vodu a prática de
batizar objetos rituais, quer dizer, dar nomes a eles. Você pode levar um maço
de manjericão e pode ungir o batismo sobre seu vidro de água que agora será uma
passagem poderosa para energia espiritual. Você pode nomear quase qualquer
coisa apropriado, de maneira fantástica e positiva - Água da Vida ou Gargarejo
da Mamãe Que Traz Espírito ou o que quer que seja!
Em um castiçal de vidro,
coloque um pouco de terra de próximo da sua casa e uns grãos de sal grosso.
Pegue uma vela branca e com algum óleo vegetal puro esfregue do meio até o topo
e então do meio até a base. Enquanto você lubrifica a vela, dirija sua energia
para suas mãos e ore por consciência espiritual. Ponha firmemente na frente a
vela no castiçal e coloque tudo na frente da vasilha de água. Não acenda a vela
ainda.
Ao redor do altar você
colocará outros objetos de acordo com os princípios divinos que você deseja
servir. Um santuário de ancestrais terá imagens de antepassados mortos, o altar
de Ogoun terá um machete e um lenço vermelho, o santuário de Erzulie Freda terá
flores e jóias, e assim por diante.
Parte 2 - Realizando um
Festim Ancestral
Agora que você construiu um
altar básico, você está pronto para o primeiro passo na prática do Vodu -
reverência aos seus ancestrais. Não importa como tenha feito seu altar, sempre
se lembre que é uma porta entre o mundo humano e o mundo dos antepassados e dos
loa. Deixe-o empoeirado, deixe que a água fique escura e envelheça, use-o como
um local conveniente para deixar chaves e lápis; ignore-o, e você se achará
cansado, drenado, azarado e não-inspirado. Trate-o com respeito, mantenha-o
imaculado, limpo, visite-o freqüentemente e você será recompensado com
crescimento espiritual, energia, vitórias pessoais e coincidências notáveis.
Seus antepassados o amam.
Eles virão e o visitarão, aceitarão suas oferendas. Eles o instruirão,
protegerão você, lutarão por você e o curarão. Eles lhe trarão mensagens
através da intuição e dos sonhos. Obtenha uma foto ou figura de um parente
falecido seu cujo amor para com você está além da dúvida. Se você não tem
nenhum parente falecido de quem você se lembre bem, ou de sangue ou por adoção,
você pode escolher uma imagem de uma pessoa que representa a você sabedoria e
amor ancestrais e dê um nome a esta pessoa. Você também pode obter imagens que
lhe agradem de antepassados de todas as raças humanas.
Coloque estas imagens atrás
da vasilha de água em seu altar, em qualquer tipo de porta-fotos ou prenda-as
na parede atrás de seu altar.
Esta parede também pode ser
coberta com um pano branco e as imagens fixadas nele. Arrume as imagens até que
você sinta como elas devem estar ordenadas. Você pode escolher trabalham com
uma imagem ou muitas.
Sente-se na frente de seu
altar. Você pode soar um sino pequeno ou pode balançar um chocalho cerimonial
para sinalizar o começo de sua meditação. Acenda a vela branca do seu altar e
se possível acenda algum incenso de coco ou baunilha. Amarre um pano branco em
volta de sua cabeça se quiser. Contemple a água no cálice central. Relaxe e
faça qualquer exercício mágiko com o qual você está familiarizado. Respire
fundo, em contagem regressiva de dez até zero ou trabalhando com os chakras,
tanto faz. Pense em seu antepassado escolhido. Se possível, relembre e
visualize cenas do passado no qual você viveu com aquele antepassado. Sinta o
amor entre vocês, que os conecta. Imagine o amor que brilha de seu coração como
um raio de luz que atravessa a água e vai para a imagem do antepassado.
Convoque o nome de seu antepassado em voz alta, repetidamente. Fale para o
antepassado que você o ama e que você quer trabalhar junto com ele. É um
princípio básico do Vodu que o vivo e o morto trabalham juntos ajudando-se
mutuamente.
Quando você sentir a
presença dos antepassados, verta no chão um pouco da água três vezes para lhes
dar boas-vindas. Faça freqüentemente esta meditação, até que seja uma rotina
confortável. Dentro de uma semana ou duas de prática regular e eficaz, você
deverá fazer um festim ancestral para oferecer a seus antepassados.
É um banquete que deve
incluir comidas favoritas de seus antepassados em vida, com a exceção que a
comida não deve ser salgada. Oferendas de ancestrais genéricos (aqueles que
você não conheceu vivos) incluem milho grelhado, amendoim grelhado, coco
fresco, comidas brancas como pudim de arroz, leite e bolos de massa com
farinha.
Coloque cada tipo de comida
em uma tigela e coloque uma vela branca entre as tigelas. Podem ser colocadas
oferendas de líquidos em copos. Toque cada prato ou tigela na sua testa,
coração e área genital e então cheire profundamente a comida (quase encoste-a
no nariz). Fale com seus ancestrais, lembre-lhes que eles já foram parte do
mundo dos vivos e que um dia você irá se unir a eles. Peça-lhes para afugentar
todo mal como pobreza, enfermidade, desemprego, fadiga, discórdia, tristeza.
Peça-lhes para trazer a você tudo aquilo é bom, inclusive amor, dinheiro, trabalho,
saúde, alegria, amizade, riso.
Acenda as velas, ponha a
comida no altar e deixe o quarto. Quando as velas terminarem de queimar, e de
preferência na manhã seguinte, pegue a comida e jogue-a fora ao pé de uma
árvore grande. Se isso não for possível, ponha-a em uma bolsa de lixo e jogue-a
separadamente de qualquer outro lixo. Lave os pratos, tigelas e copos,
esfregue-os com sal e separe-os. Não os use para qualquer outra coisa, nem
mesmo para refeições comuns, apenas para outro trabalho de Vodu.
Parte 3 - A Experiência de
uma Mambo.
Meu primeiro banquete
ancestral aconteceu antes de que eu fosse ordenada como uma Mambo. Eu queria
que tudo estivesse tão bonito quanto possível, assim eu limpei minha sala
primeiro, então meu altar e todos os objetos do altar, cristais, panos do
altar, etc. Eu borrifei o altar com perfume e pus velas novas nos castiçais.
Eu fiz tipos diferentes de
comida. Havia galinha, arroz e feijão, verduras cozidas e frutas tropicais para
meus antepassados africanos; salsicha, batatas cozidas, saurkraut e doces para
meus antepassados europeus, amendoins tostados, milho fervido e carne de coco
como comida genérica de antepassado. Havia cerveja, rum, leite, suco de fruta -
em resumo, tudo eu pude pensar. Todo prato de comida teve sua própria vela. Eu
apresentei as comidas e as bebidas para os antepassados, acendi as velas,
meditei e deixei o quarto.
Aquela noite, eu tive alguns
sonhos muito interessantes. De manhã, eu notei a condição das velas - toda vela
foi queimada até o fim - nem uma gota de cera ou um fragmento de pavio
permaneceu em qualquer dos pratos. Puxa , eu pensei, esses antepassados
realmente deviam estar famintos! Eu recolhi a comida e coloquei tudo ao pé de
uma árvore perto de um rio. Enquanto eu caminhava para casa, eu pensei, qual de
meus ancestrais ou loa virá me ajudar agora ?
Era um dia bonito de
primavera e eu estava caminhando só em uma estrada rural. Um pequeno fusca
amarelo estava passando e buzinou. Eu pensei que a pessoa devia estar perdida e
queria indicações, mas assim que olhei, não havia motorista no carro!
Instintivamente eu notei a placa - 125 LOA !
Agora, você poderia pensar
que alimentar e servir 125 loa deixaria minha conta do supermercado enorme. Mas
de fato, a parte de cerimônias maiores, os serviços regulares para os
antepassados consistem de um pouco de comida no jantar de segunda-feira,
libações ocasionais e a observância correta do Festim dos Mortos (Fet Ghede) a
cada 2 de novembro.
Email: apocalipsedosanjos@hotmail.com
Twitter: @Noitedoanjo
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